Conto criado em parceria com a IA ChatGPT em 6/2/2023. Neste texto, foram cortados apenas as interações com a máquina, algumas interrupções, incompreensões e retomadas de curso. Veja o original (eu recomendo ler primeiro, sem ter bem como distinguir entre eu e ela). Será feita uma versão editada deste texto, aperfeiçoando coesão e estilo.
Eles tinham conhecido Jacques por toda uma vida. Haviam estudado com ele, passado pelas mesmas dificuldades dos princípios da magia, se debruçado por horas sobre os mesmos livros. O que errado? Qual elemento se interpôs e tornou tão diferentes os destinos? Agora Jacques era um inimigo, e estava diante deles com as mãos em chamas púrpuras. Haviam-no encurralado em um dos recessos da Biblioteca Principal, onde estava guardado um dos mais poderosos tomos de magia. O rosto de Jacques trazia uma expressão zombeteira e maldosa quando ele disse: “O que eu tenho agora é o que vocês todos, secretamente, desejam. Não perdemos nada deixando que a magia consuma a carcaça da humanidade que nos envolve. É uma libertação. Não querem se juntar a mim e beber da fonte que nunca se esgota?”
Os guardiões olharam uns para os outros, sem saber como responder. Eles tinham sido treinados para proteger a humanidade da magia, não para ceder a ela. Mas, ao mesmo tempo, eles sentiam uma atração quase irresistível pela fonte inesgotável de poder que Jacques estava oferecendo. Era como se a magia estivesse chamando por eles, convidando-os a se juntar à sua dança perigosa e sedutora. A liderança dos guardiões, uma mulher chamada Aria, falou primeiro. “Não, Jacques. Não vamos ceder ao poder da magia. Temos uma responsabilidade maior do que nossos próprios desejos.” Ela ergueu sua mão, revelando uma runa brilhante tatuada na palma. A runa começou a brilhar com uma luz fraca, mas persistente. “Nós temos a luz da razão e a força da vontade. Isso é o que nos mantém humanos, mesmo quando usamos a magia.” Jacques riu, uma risada gutural e sem humor. “Vocês são tão ingênuos. Não conseguem ver que estão presos em uma ilusão. A magia é tudo o que existe de verdadeiro e poderoso neste mundo. Eu vou provar isso para vocês.” E, com essas palavras, ele lançou uma bola de fogo púrpura na direção dos guardiões.
Sem que Aria precisasse fazer um gesto, a runa na palma da sua mão intensificou seu brilho rapidamente, até o ponto em que parecia não ser feita de carne, mas de pura luz. A bola de fogo, que vinha com ímpeto, ao ser tocada por essa luminescência, foi desacelerada. Quando chegou a poucos centímetros de Aria, estancou. Pequenas linhas brancas pulsantes começaram a se entremear com o roxo daquele fogo mágico que bruxuleava em forma esférica. Jacques riu. “Aria, Aria, Aria! Tão ousada! Eu sei o que você está fazendo. Não pensei que puxaria essa carta tão cedo. Quer dizer que pretende fazer uma visita?” A essa última palavra, “visita”, ele deu um tom que se poderia dizer até sedutor. Um tom faminto. Aria respondeu: “Nem mesmo esperava te surpreender com isso, Jacques. Aliás, para o que estou fazendo, é mesmo produtivo que o alvo saiba o que está acontecendo. Uma visita, você disse? Sim. Não uma invasão. Uma visita”. Os fios brancos haviam já se enredado com padrões octogonais que flutuavam sobre as chamas; dentro da bola de fogo, as linhas serpenteavam sem fim ou compunham microscópicos fractais. Aria continuou: “Sim. Declaro minha intenção. Este é o feitiço da Ponte. Todo ato de magia é uma abertura da alma do mago. Sua alma está aberta. A minha alma está aberta. Eu as conectei e vou passar da minha à sua. Vou entrar. Vou descobrir o que está errado”. E ela conteve a frase que seguiria a essa. Ela quis dizer, mas não pode: “E vou trazer você de volta”.
Aria inspirou profundamente, concentrando-se na tarefa que se propunha. Ela estendeu a mão com a runa brilhante e tocou na bola de fogo, que agora parecia ter congelado no ar. Imediatamente, Aria sentiu uma intensa vibração que partiu de seu coração e se espalhou por todo o seu corpo. Era como se sua alma estivesse se esticando, como se ela estivesse se aproximando da alma de Jacques. Ela sentiu que estava caminhando por um corredor escuro, cheio de sombras e medos. Então, de repente, viu-se diante de uma porta de madeira escura. Ela pôs a mão na maçaneta, e abriu-a.
Ao lado de Aria, Jacques sorria com malícia, sabendo o que estava por vir. Mas Aria não se deixou intimidar. Ela havia se preparado para o que quer que fosse encontrar na alma de Jacques. Estava determinada a descobrir o que o havia levado ao caminho da maldade. E, se possível, ajudá-lo a encontrar o caminho de volta.
Na biblioteca, os outros guardiões – Omaha, Igiaba, Bruno e Scotus – só puderam observar enquanto a bola de fogo foi extinta, assim como a luz da runa: na escuridão entre as estantes repletas de grossos livros empoeirados, apenas uma fina linha brilhava tímida, partindo do peito de Aria até o peito de Jacques. Ambos estavam paralisados. Nos seus olhos, não se via as pupilas, só a parte branca. Seus pés flutuavam a poucos centímetros do solo, como marionetes em descanso. Omaha foi a única a dizer alguma coisa: “Aria, espero que você saiba o que está fazendo”.
Na Ponte entre as almas, Aria havia aberto a porta. Viu-se em um corredor de carpete vermelho, com várias portas de mogno claro, numeradas, de um lado e de outro, como em um hotel. As maçanetas eram de ouro, assim como as dobradiças e o suporte dos números. Ela se aproximou da primeira. A maçaneta era quente ao toque. Girou. Dentro, um quarto de hotel normal e vazio. Ela foi ao próximo. Era idêntico. E o próximo, e o próximo, e o próximo. No último dos quartos, sem outra diferença em relação aos anteriores, estava uma criança sentada na cama. A criança fitou Aria com uma expressão e fria e falou, emitindo uma voz distorcida, como se dupla, ao mesmo tempo enunciada em tons graves e agudos: “Você cometeu um grande erro. Você nunca vai sair daqui. Mas eu vou te dar a resposta que busca antes de acabar com você e seguir meu destino. Quer saber por que escolhi esse caminho? Por que abandonei a razão e a força de vontade, como você disse? Pergunte”.
Aria estava confusa com a resposta da criança. Ela tinha entrado na alma de Jacques com a esperança de descobrir o que havia acontecido para que ele perdesse sua humanidade, mas agora parecia estar presa na Ponte entre as Almas, com uma criança ameaçadora à sua frente. Ela decidiu perguntar, na esperança de encontrar uma saída. “Por que você escolheu esse caminho?” perguntou Aria. A criança sorriu, mas a expressão no rosto era fria e sem emoção. “Eu não queria ser como eles. Eu não queria ser limitado pela humanidade. Eu queria poder, e para isso eu tinha que abandonar a razão e a força de vontade.” Aria franziu a testa, ainda confusa. “Mas isso não é viver, é apenas existir.” A criança deu de ombros. “Eu não preciso viver, eu sou o poder.” E com isso, a luz na Ponte entre as Almas apagou-se e Aria despertou no corpo de Jacques, mas algo havia mudado.
Na Ponte entre as Almas, Aria se deparou com uma criança sentada em uma cama de hotel, com um olhar frio e uma voz distorcida. Embora ela soubesse que esta criança era, de alguma forma, Jacques, ela estava perplexa com a aparência e comportamento dele. “O que aconteceu com você, Jacques?” – perguntou Aria, tentando esconder sua confusão e medo.
A criança sorriu sinistramente. “Eu já não sou o Jacques que você conheceu”, disse ele, sua voz ecoando nas paredes do quarto. “Mas você já deve ter percebido disso. Eu não sou mais humano.” Aria se perguntou se a perda da humanidade de Jacques estava relacionada a sua infância, se algo aconteceu para fazê-lo escolher esse caminho sombrio. Ela decidiu perguntar de uma forma sutil, tentando não ofendê-lo. “Você já foi humano, Jacques. O que o levou a abandonar essa parte de você?”
“Um homem que voltasse a enxergar perfeitamente não precisaria mais de óculos”, respondeu Jacques no corpo da criança, “um homem que voltasse a andar perfeitamente não precisaria mais de bengala”, disse ele com aquela voz dupla, grave e aguda a um só tempo, “eu não preciso ter humanidade, pois estou além disso. Vejo quando antes não via. Ando quando antes não andava”. Aria retrucou: “Ser humano não é uma questão de poder fazer isso ou aquilo. A humanidade não é uma técnica que possa ser replicada”. Jacques riu, e era como se todo o quarto de hotel risse com ele, com vozes ecoando de todos os cantos, múltiplas, incoerentes. Mas quando ele voltou a falar, toda essa cacofonia estancou de uma só vez: “Então, me diga, Aria, o que é ser humano?”
Aria pensou por um momento antes de responder, sabia que a resposta a essa pergunta era importante. “Ser humano é ter empatia, compaixão, sentimentos e emoções. É ter consciência do que é certo e errado e ter a capacidade de escolher entre eles. É ter a capacidade de amar e ser amado, de sonhar e de esperançar. Ser humano é ter a capacidade de mudar e evoluir, aprender e crescer.” Jacques ouviu com atenção, como se estivesse ponderando sobre as palavras de Aria. “Interessante”, disse ele finalmente. “Mas você sabe que não é possível ter tudo isso sempre, não é mesmo? Há momentos em que precisamos abrir mão de algumas coisas para sobreviver. E se abrir mão da humanidade significa ter mais poder e percepção, então eu escolhi isso sem hesitação.”
“Você fala de poder”, retrucou Aria, “e você dá a entender que querer poder é ter finalmente deixado para trás a humanidade. Mas o que é mais humano do que a vontade de poder?”. Dessa vez, foi Aria quem riu. “Quer mais poder, e diz que isso é ser menos humano. Não, Jacques, você talvez nunca tenha sido mais humano do que agora. Deixar-se embebedar pelo poder? O que há de mais humano do que isso? Esquecer-se de quem é, trair quem esteve ao seu lado? Tudo isso já foi feito pela humanidade”. A criança que era Jacques teve um esgar de desgosto. Saltou da cama e se aproximou de Aria. Olhando para cima – sua altura batia pouco acima da cintura dela –, ele falou: “Foram os nossos mestres com seus livros e escolas que disseram que tomar o poder mágico em sua inteireza é perder a humanidade. Você agora discorda deles?”. Aria respondeu sem hesitar: “Talvez eles tenham usado o termo errado. A humanidade sempre foi bem e mal entrelaçados. Pendemos para um lado ou para o outro. Mas eles estavam certos em relação a uma coisa: fazer o que você fez é perder algo. Você perdeu a capacidade de decidir entre uma coisa e outra, Jacques. Você se decidiu pelo poder, e o agora o poder decidirá tudo no seu lugar”.
“Não acredito”, respondeu Jacques com um sorriso frio, “eu tomei o poder e escolhi o meu destino. Não há mais nada a escolher. Eu sou livre”. Aria sacudiu a cabeça, “Não, você não é livre. O poder escolheu por você. Agora é só uma marionete. Você não tem mais escolha. Você é preso ao seu próprio desejo”. Jacques franziu a testa, com raiva crescente em seu olhar. “Você não entende, Aria. Eu sou o poder agora. Eu sou o mestre”. Aria olhou-o fixamente, “Você é o escravo do poder. E agora está preso a ele para sempre”.
Jacques gritou: “Não!”. A voz estridente e grave vibrou em todo o quarto e fez as paredes tremerem. “Não!”, ele gritou novamente, “não, não, não!”, e dezenas de vozes ecoaram essa negação, descompassadas, guturais, cortantes, até que cessaram, e quando Jacques voltou a falar, elas falaram todas juntas com ele, o quarto e sua legião de almas, assim, disseram em uníssono: “É você, Aria, que é a marionete”. A parede atrás de Aria e o chão ao redor dos seus pés estouraram, cuspindo cordas que se amarraram em seus pulsos. “É você, Aria, quem está presa para sempre”, continuou Jacques. Aria estava presa pelos pés e mãos, e as cordas começaram a ser puxadas com força, como se quisessem despedaçá-la membro a membro.
Aria lutou contra as cordas, mas elas eram fortes demais. Ela sentiu a força sombria e maligna que as controlava, e soube que estava perdida. Então, uma luz brilhante surgiu na escuridão, iluminando o quarto e banindo as trevas. Aria sentiu uma presença reconfortante, e reconheceu a voz de seu mestre. Ele se aproximou dela, seu rosto sereno e seus olhos brilhantes como estrelas. “Não tema, Aria”, ele disse. “Eu estou aqui para ajudá-la”. Ele estendeu a mão, e Aria sentiu as cordas se afrouxarem e se desfazerem ao seu redor. Ela se levantou, e seu mestre a envolveu em um abraço confortador. “Você fez um bom trabalho, Aria”, ele disse. “Você aprendeu muito nesta jornada, e agora é hora de você retornar para casa”.
Casa. Essa palavra levou aos ouvidos de Aria uma nostalgia e um prazer delicado. O mestre estava certo: ela já fizera muito, era hora de deitar as armas ao chão e descansar. Não era? Não era? Não era. Havia algo de errado. Ela resistiu à sensação de perdição que a havia tomado, e ela resistiu também à sensação de alívio que havia se anunciado. Aquilo não era seu mestre. Aquilo era como as cordas que prendiam suas mãos e pés, eram o equivalente delas para a sua alma. “Jacques!”, ela disse, ofegante, com voz sofrida, “eu te disse que a magia é uma abertura à alma do mago. Você usa sua magia contra mim aqui, nessa ponte entre nossas almas feita de magia. Você usa uma magia mais profunda e vital. E assim você se abre mais vital e profundamente”. Aria então abriu a boca, e uma luz surgiu da sua garganta. Num átimo, essa luminosidade recobriu o quarto, chocando-se contra as paredes como se fosse sólida. Jacques foi jogado contra o chão. “Eu estive dentro de você”, disse Aria, sua voz como que vibrando a partir de todo o seu corpo, “agora você estará dentro de mim”. A luz que vinha da boca dela girou como um redemoinho e passou a sugar tudo o que havia no quarto para dentro dela. Cama, piso, lâmpadas, madeira, pano, vidro, tudo foi puxado violentamente do lugar e tragado para dentro dela, que já não era mais corpo, mas uma fenda energética rasgando o espaço. Jacques resistiu o quanto pode. Sua imagem alternava entre a personificação infantil e sua aparência verídica, até que essa última permaneceu, e ele foi engolido.
Quando Jacques abriu os olhos novamente, ele viu ao seu redor a sala de aula da escola de magia onde eles se conheceram, muito novos. “Estou dentro da sua alma”, zombou ele, “e ela é uma escolinha. Cai bem a você”. Mas Aria ainda não podia ser vista em parte alguma.
Jacques se levantou, sentindo-se confuso e enganado. Ele havia sido levado para dentro da alma de Aria, mas ele não entendia como isso tinha acontecido. Ele estava em uma sala de aula, uma lembrança de sua juventude, e ele não tinha como sair. “Aria!”, ele gritou, mas ela não respondeu. Jacques começou a explorar a sala, procurando por alguma saída, mas a porta estava bloqueada. Ele se perguntou o que tinha acontecido e como ele poderia escapar. Ele tentou usar sua magia, mas ela parecia inútil. Jacques começou a se sentir preso na alma de Aria, e ele não sabia o que fazer.
De repente, ele ouviu o barulho das crianças. Ele se aproximou do batente da porta e viu conforme os alunos vinham chegando, e passavam por ele sem notá-lo – até mesmo o atravessavam, como se ele fosse um fantasma. Os estudantes se dirigiam às suas cadeiras em grande algazarra, até que o professor chegou. Jacques gritou. Ninguém deu sinal de que o ouvia. Aria lhe havia colocado em algo como uma memória. Ele só podia assistir. Sentindo-se terrivelmente cansado, sentou-se em uma das cadeiras. “Vamos então jogar o jogo”, ele pensou. Diante da classe, o professor começou a dar a aula. “O tema de hoje”, anunciou ele, “são bolas de fogo e suas várias cores”.
Jacques se sentia impotente enquanto via a aula sobre bolas de fogo e suas várias cores se desenrolar diante dele. Ele sabia que estava preso dentro da alma de Aria e que, para escapar dali, precisava descobrir como ela havia feito isso. Enquanto tentava encontrar uma saída, seus pensamentos foram interrompidos por um aluno que levantou a mão para fazer uma pergunta. Jacques ficou surpreso ao ver que, ao se concentrar na criança, ele conseguia ver sua alma – uma pequena bola luminosa que pairava dentro dela. Tal visão lhe deu esperança de que houvesse uma saída.
“Eu pensei que toda bola de fogo era… cor de fogo”, disse o aluno, fazendo as outras tirem, “quer dizer, vermelhas”, ele continuou. O professor respondeu: “Quando neutras, sim. Mas o mago pode, voluntária ou involuntariamente, embebe a magia com a sua personalidade. Então o fogo criado tem a cor da sua alma. Alguém sabe dizer o que significa cada cor, o que cada cor diz da alma de cada um?”. O professor olhou a classe, alguns estavam sequiosos por responder. “Muito bem”, disse ele, “o que significa o roxo?”
Jacques não conseguia acreditar que estava assistindo a essa aula. A escola de magia era um lugar distante para ele agora, uma memória distante. E ainda assim, ali estava ele, vendo tudo acontecer novamente. Ele observou o aluno perguntando sobre as cores das bolas de fogo e o professor respondendo. Ele sabia que a cor roxa representava sabedoria e orgulho. Será que ainda carregava essa característica em sua alma?
“Sabedoria e orgulho”, falou um menino da última fileira. O professor sorriu: “Sabedoria e orgulho. Sim. Mas é possível ter sabedoria e orgulho ao mesmo tempo?”
Jacques observou atentamente a aula, sentindo-se intrigado pela relação entre magia e alma. A cada resposta, ele começou a se perguntar se sua própria cor seria reveladora da sua jornada. Será que sua cor seria um reflexo de sua busca pelo poder e sua consequente perda da humanidade? Enquanto ele se perdia em seus pensamentos, o professor continuou a explicar os significados das diferentes cores da magia.
“Sabedoria”, explicou o professor, “é um enriquecimento lento e sem fim. Já o orgulho é um enriquecimento imediato e insustentável. É possível ter sabedoria e orgulho ao mesmo tempo? O que vocês acham?”. O professor observava um a um, esperando uma resposta.
Alguns dos alunos hesitaram antes de responder, mas então uma menina no meio da classe ergueu a mão. “Eu acho que sim, é possível ter sabedoria e orgulho ao mesmo tempo”, ela disse. “Mas é preciso equilibrá-los. Se você tem muito orgulho, pode se fechar para novas ideias e perder a sabedoria. Se tem muita sabedoria, pode faltar um pouco de orgulho para defender suas crenças e valores”. O professor assentiu, satisfeito com a resposta. “Muito bem, você tem razão. O equilíbrio é a chave, sempre”.
Jacques conhecia aquela menina. Havia esquecido esse rosto após tanto tempo, mas… sim, era Aria. Aluna bem mais dedicado do que ela, sempre a primeira de mão erguida para atender às questões dos professores. “Aria, esse teatrinho não vai me comover!”, ele gritou, sem que ninguém na classe tivesse consciência de que ele estava ali. “Você acha que uma liçãozinha sobre equilíbrio vai me fazer mudar de ideia? Venha e lute comigo até o fim de uma vez por todas!”. Mas Aria – a Aria adulta que o havia prendido ali – não apareceu. Já a Aria criança sorria ao professor, satisfeita por ter respondido bem, enquanto o mestre seguia falando: “O equilíbrio é a chave. Ou melhor: é uma chave. Abre uma porta, e não outras. A sabedoria é uma chave também. A sabedoria abre quais portas, alunos? Que oportunidades traz a sabedoria?”
“A sabedoria traz a compreensão das coisas, a paciência e a humildade”, respondeu outro aluno. “É uma chave para se tornar um mago melhor, mais consciente de suas ações e de sua própria alma”. O professor concordou: “Exato. Mas o orgulho é uma chave também. Ele abre quais portas, alunos?” Uma pausa caiu sobre a sala enquanto os alunos refletiam sobre a pergunta. Jacques, por outro lado, estava impaciente e irado, querendo uma resposta de Aria. Porém, ela não apareceu.
Apenas sua versão criança se manifestou. “O orgulho”, disse a pequena Aria, “abre a porta da autoconfiança, da resistência e da capacidade de fazer para si um destino. Há orgulho quando nos tornamos magos, há orgulho quando melhoramos como magos, há orgulho quando cumprimos uma vida inteira como magos. Eu tenho orgulho agora mesmo de poder responder assim”. O professor sorriu: “O orgulho é dinâmico, então. A sabedoria se acumula como um lago, como um mar, mas o orgulho corre como um rio”. Jacques não entendia: por que esse elogio do orgulho? Ela não estava tentando convencê-lo a ser fraco? O professor acrescentou: “Mas e se o orgulho para de correr? E se ele não aceita que deve surgir e ceder, aparecer e desaparecer, viver e morrer? O que ocorre com o indivíduo se o orgulho se torna água parada? O que ocorre com o mago que esquece o devir?”
A aula prosseguiu, mas Jacques ficou pensando na pergunta do professor. Seria o orgulho algo que precisava ser controlado, equilibrado com a sabedoria? Era necessário permitir que ele surgisse, mas também deixá-lo ir embora? Aprender a viver e morrer com o orgulho, como o professor dissera, era algo que requeria sabedoria e humildade. Jacques se perguntou se ele mesmo havia encontrado esse equilíbrio em sua vida, ou se havia se deixado consumir pelo orgulho. Talvez fosse hora de buscar a sabedoria para equilibrar seu orgulho.
Em um certo nível, Jacques realmente acreditava nisso. Estava sendo convencido. Em outro nível, sabia que eram essas as palavras que Aria gostaria de ouvir. Por isso, queria dar sinais de derrota, para se libertar da prisão em que ela o colocou. Mas ele assim o fez, e nada aconteceu. A aula terminou, outros alunos vieram, outras coisas foram ditas, a escola se esvaziou ao fim do dia e nada aconteceu. No outro dia, tudo se passou de forma idêntica, a fala sobre a cor das bolas de fogo, o roxo e a alma, o orgulho e a sabedoria, depois as outras e irrelevantes aulas e a escola fechada. Jacques se revoltou com a repetição dos dias por uma semana, um mês, seis meses, dois anos, até que se cansou, e teve de atravessar ainda dez, quinze, trinta anos do mesmo dia, o mesmo debate sobre chaves e águas. Ele nem mesmo sentia vontade de sair dali. Toda a sua vontade de poder havia sido abatida. O silêncio, a rotina, já lhe agradavam como uma casa.
Até que um dia, 50 anos depois, o professor se dirigiu a ele diretamente – e todos os alunos na sala viraram seus rostos na sua direção – e questionou: “O que significa a cor roxa?”
Ele sabia que precisava encontrar as palavras certas, aquelas que pudessem libertá-lo dessa eterna ilusão e finalmente encontrar a resposta para sua pergunta. Ele se concentrou e começou a falar: “A cor roxa é a cor da sabedoria, mas também da humildade. É a cor da humildade porque sabe que a sabedoria não é algo conquistado por si mesmo, mas sim algo que é concedido e compartilhado. É a cor da sabedoria porque sabe que deve usá-la para o bem, e não para satisfazer seus próprios desejos. Eu sei que cometi muitos erros, Aria, e eu me arrependo profundamente. Eu quero que você saiba que eu aprendi a lição, e que eu juro usar meus poderes daqui em diante para o bem.”
Aria ouvia, sem dizer uma palavra. Mas Jacques sabia que ela o estava ouvindo. Ele sabia que finalmente havia encontrado a liberdade.
Sim, mesmo sem que ela falasse, mesmo sem que ela o libertasse, ele sabia. Pois não estava fingindo. Por mil vezes ao longo dos anos ele repetiu essas palavras como um engodo – queria mostrar a ela que era bom, queria sair da prisão por bom comportamento, queria armar uma armadilha. Mas pouco a pouco aquelas palavras ditas com ironia, como falsidades, foram ganhando um sentido. Pois ele fora forçado à humildade, e a situação lhe deu uma sabedoria que nada tinha a ver com poder. Era abundante de tempo e de lições, mas alheia à capacidade de ação. Jacques descobriu dentro da alma de Aria um novo modo de ser, e sabia que não o abandonaria após ter saído dali, se saísse algum dia, porque aquilo era mais valioso que o poder. Sim, estava livre, porque nem mesmo queria ser libertado. Poderia viver ali, dentro de uma memória, dentro de uma alma, vivendo com ilusões como um fantasma, para sempre.
Jacques aceitou seu destino de viver eternamente dentro da memória de Aria, mas ele sabia que precisava responder à pergunta do professor. Ele respirou fundo e disse: “A cor roxa significa humildade e sabedoria. Eu aprendi isso ao longo dos anos preso aqui. Eu queria o poder acima de tudo, mas agora entendo que a verdadeira força vem da humildade e da sabedoria”. O professor assentiu, compreendendo a mensagem de Jacques, e ele sentiu a prisão se desfazendo ao seu redor. Ainda preso dentro da memória de Aria, mas agora livre para sempre explorar as lições que aprendeu.
Não vivia apenas o mesmo dia, na mesma sala de aula. Podia navegar entre memórias múltiplas, transitar por outros momentos em que viveu com Aria, e pelos momentos que Aria viveu com outras pessoas. Percebeu que podia até ir além dela, visitar sonhos e imaginações de muitos outros. Tornou-se um viajante entre pensamentos e percepções. Não tinha mais consistência do que a sensação do toque, um vislumbre ou… uma cor. “A cor roxa significa um cruzamento entre mundos”, disse ele, e se deixou desfazer definitivamente, misturando-se ao mundo, aceitando morrer para que outras coisas vivam.
Ao mesmo tempo em que se entregou, Jacques sentiu que sua alma se expandia, se tornando parte de todas as memórias e percepções que visitara. Sua cor roxa se disseminou por todos aqueles que conhecera, tornando-se uma espécie de fio condutor entre seus sonhos e suas realidades. Ele não era mais Jacques, o mago, nem Jacques, o fantasma. Era apenas a cor roxa, a essência da sabedoria e da humildade que havia aprendido ao longo dos anos, preservada para sempre nas almas de todos aqueles que conhecera. E assim, sua história se tornou uma lenda, uma história que seria contada de geração em geração, na escola da magia, como um exemplo de como o orgulho pode levar à perda da humanidade, mas também como a humildade pode levar à eternidade.