O cantor se anuncia e/ou se descreve, torna sua apresentação um tema da música.


(…) eu sou fé em Deus e pé no mundo
e sem carta e sem selo
eu vou, eu vou
eu sou, eu sou

eu sou Baby Consuelo!
eu sou Baby Consuelo!
eu sou Baby!
Baby Consuelo!

A falante se diz equilíbrio (entre transcendência e realidade) e nega apoios externos (não é recomendada, não é referendada). É regra de si mesma: eu quero assim porque eu sou dessa forma, o que é sugerido por “eu quero é peles, panos // cores mil // porque em cima de moi, só confecções” — aliás, forçando um pouco a interpretação, podemos entender que ela aceita sobre si só “confecções” porque para além dela é tudo construído, insubstancial. Para além de um núcleo que parece ser a sua vontade mais funda (“porque o corpo mesmo está por dentro da pele”), tudo parece ser aberto à intervenção (à decoração?): o sujeito é o irredutível que escolhe, todo a multiplicidade é externa e a seu gosto.

muito prazer, eu sou Zezé
mas você pode me chamar como quiser
eu tenho fama de ser maluquete
ninguém me engana nem joga confete

muito prazer, eu sou Zezé
uma rainha, uma escrava, uma mulher
uma mistura de raça e cor
uma vida dura mas cheia de sabor (…)

eu sou Zezé
da terra do sol,
da lua de mel
da cor do café

Desde que se coloca que o nome não importa (o que é reforçando em “oi, eu sou Zezé // tem gente que me chama de Chica, outros de Zezé // mas tu há de me chamar como quiser”), se afirma que quem fala é algo de indefinível. É louca, mas sensata, sofrida, mas curtida; os substantivos singulares que toma para si se aprofundam em paradoxos: mistura de raça (que aqui soa como uma determinação) e cor (que refere ao indeterminado) e mulher, que abrange regência (o quase ilimitado do poder?) e escravidão (o quase ilimitado da submissão?). No fim das contas, o sol, o mel e o café parecem apontar que, sim, algo pode definir quem fala: uma alegria que é alegria de tudo, até de ter sido triste.

eu me apresento em alto e bom som, para que todos possam ouvir
cara sagaz e cascudo, direto do Andaraí
eu vou do M para o A para o R para o C para o E para o L para o O, espaço, D, 2
sempre representando o hip-hop
não tem Faustão nem Gugu, eu sou o primeiro do Ibope

Há outras autodescrições nessa letra, porém elas parecem visar mais a propor ou afirmar modos de viver; neste trecho trata-se de se referir à origem, enunciar o nome, dar-se uma tarefa, fazer o próprio elogio.

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