Senti até uma nostalgia com a teoria da conspiração divulgada esses dias por Ailton Benedito, secretário de Direitos Humanos (!) da Procuradoria-Geral da República. É um exemplo de alta criatividade do que hoje comanda o Brasil:

Bill Gates quer impedir que raios solares cheguem à Terra, baixando a imunidade dos seres humanos, o que propiciaria o surgimento e o agravamento de n doenças para as quais a Fundação Bill & Melinda Gates forneceria novas vacinas por módicas centenas de bilhões dólares?

O que é isso, minha gente? É fase 4 do universo Marvel, fanfic do Wattpad?

Bill Gates quer bloquear o sol! Mas não contava com Ailton Benedito, sempre a postos!

Todavia, quando eu li essa fake news, veio uma sensação boa. Sim, depois de desaparecerem as imagens quadrinescas na minha mente — o dono da Microsoft, em uma base espacial, observando o astro solar com ambição, metade do seu rosto coberto pela sombra, outra pela luz que odeia… — eu pensei: olha só, voltamos aos boatos com o nome do Bill Gates.

Foi como encontrar um velho amigo. Bill Gates com planos de dominação mundial é uma coisa que está por aí desde meus 12 anos, provavelmente antes. Quando eu cheguei na internet era tudo mato e o mouse e a tela eram as marcas da Besta. Tudo provado com os versículos bíblicos pertinentes.

Em um tempo pré-hegemonia do Google, AOL ainda mandava CDs para a sua casa, “blogosfera” estava para se tornar uma palavra importante, o Estadão publicava livro com listas de links e a internet tinha tutoriais de como desvendar as raízes satânicas da Microsoft, com meios contraditoriamente deixados por ela mesma como easter egg em um aplicativo do Windows.

Se você tiver um Windows 97 e quiser encontrar os sinais de Lúcifer, tem de fazer assim: um dos protetores de tela (eram animações que rodavam com o computador inativo, não são mais comuns) desse sistema operacional é um labirinto que percorremos em primeira pessoa (tipo o jogo Doom). Com isso na tela, segure tais teclas por x tempo. Pronto.

Vamos para uma sala modelada em 3D da década de 1990, em que na parede corpos ensanguentados amontoados sofrem sua tortura eterna — o tutorial alertava: “É exatamente como no Advogado do Diabo“. Havia ficado impressionadíssimo com o filme. Tentei achar o capeta. Não achei.

Até hoje não sei se foi porque fiz algo de errado, apertei tab por um segundo a menos, sei lá, e o demônio hoje sorri ao lado de Bill Gates na base espacial, aliviado pelo dia em que escapou de ser pego em flagrante por um menino de 12 anos. Ou, mais provável, naquela época também os ailton beneditos do mundo estavam atentos: denunciaram, a Microsoft recuou.

Me livraram, por pouco, do inferno. Obrigado, ailton beneditos do mundo. Perseverem. Salvem mesmo o sol. Precisamos dele.

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