Eu não sou dos que acreditam nesse fetiche do “livro que prende”, não preciso ser arrastado como bote baleeiro pela baleia arpoada, eu leio inclusive ou especialmente o que me repele, mas não há como negar o prazer do arrasto, o mundo de fora subtraído, o mundo de dentro em redemoinho, páginas se sucedendo o mais rápido que podemos, imagens acumulando no cinema mambembe da mente. Fazia tempo que isso não me acontecia — ênfase nisto: trata-se de um acontecimento —, porém terminei há pouco Moby Dick — e, na ponta da cauda do perfil de homens exuberantes e trágicos, no sopro de espiráculo das lentidões e dos surtos da vida no mar, os três últimos capítulos, dedicados aos três atos da caçada final, me leram. Juro por deus (o mesmo a quem um dos imediatos do Pequod recorre diante da testa-aríete do cachalote que avança), prendi a respiração, e eu não estava sob a água vendo a águia afogar pregada no mastro; tive o corpo tenso, a barriga dura. Li um livro, adoeci? Ishmael, meu narrador, somos dois os sobreviventes.

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