texto originalmente publicado no Bibliofilia Cotidiana
Confesso: sempre gostei mais do real, do concreto. Nas artes aprecio pinturas que lembrem fotografia impressa com pincel, no cinema prefiro histórias mais cotidianas que não flertem muito com o absurdo (contradição: Labirinto, com David Bowie, ainda é um dos meus filmes favoritos), e na literatura eu mesma opto por histórias mais concretas (tipo a narradora que está morta… bom, talvez eu trabalhe com fantasia muito mais do que imagino…).
Enfim, chegou pra mim o livro As esferas do dragão, de Duanne Ribeiro. O próprio nome já me indicou ser uma fantasia, só posteriormente que descobri que existe todo um público que vai reconhecer a história só pelo nome.
Temos, ao início do livro, a triste morte do avô do protagonista/narrador que, ao fim do capítulo, revela ser ele mesmo o autor, Duanne. Não sei se o avô de Duanne faleceu, mas ao que me parece, é muito verídica sua dor. Cada um lida com o luto à sua forma, e a de Duanne foi buscando as imaginárias esferas do dragão para ressuscitar o ente perdido.
Antes da busca pelas esferas, o autor já demonstra uma linguagem muito particular. Não há concretude em sua narração, como se desde a primeira linha, Duanne tentasse nos colocar dentro de sua imaginação, ali um tanto caótica pela dor.
É como estar em sua mente. Coisas acontecem de repente, como foi de repente que Duanne tinha ao seu redor pessoas com nomes japoneses mesclando com pessoas da família com seus nomes brasileiros, em um breve pé na realidade. Inclusive algumas das esferas que ele busca resgatar em sua trajetória são associadas à pessoas.
A partir do momento em que Duanne anuncia ao leitor que buscará as esferas, o Duanne escritor se converte em Duanne personagem de si mesmo. Ele entra em uma aventura que sabemos não ser real. Duanne, o escritor, não viveu nada disso que não na sua própria imaginação, mas Duanne personagem viveu cada linha dessa história construída a partir do luto.
Foi somente quando fui ao google buscar uma imagem para essa resenha que me deparei com a origem da fantasia de Duanne: Dragon Ball. Daí vieram os nomes em japonês, e outras coisas passaram a fazer sentido.
Não conheço Dragon Ball, talvez se conhecesse teria pego a referência de imediato e associado toda a narrativa ao mangá. Fico feliz de não saber e aconselho o leitor que curte Dragon Ball: tente ler de mente limpa, sem permitir que a criatividade dos autores do mangá contamine a criatividade do autor de As esferas do dragão.
Duanne mergulha em sua infância para crer que as esferas imaginárias poderiam trazer seu avô de volta. Não podiam, mas não deixou de ser mágica sua aventura com um propósito tão puro.