Paixão pelo afeto negativo

O eu-lírico possui algo como uma ligação afetiva com sentimentos de teor negativo.

O efeito é surpreendente na medida em que não se diz sentir o sentimento, mas estar engajado em uma espécie de relacionamento com ele, o que implica uma troca, uma convivência pacífica e/ou uma produtividade do negativo.


I’m married to my boredom

Não simplesmente estar entediado, mas casar-se com o tédio. Um casamento pode percorrer um contínuo entre compromisso e letargia; essa extensão enriquece a metáfora usada aqui. Coaduna com uma música cujo refrão é “I’m sleeping through the war” — o grande conflito, a grande perda de vidas não pode lhe tirar da cama. Compare com “By the time the first bombs fell, we were already, already bored”, em “The Suburbs“, do Arcade Fire.

I’m in love with my sadness

Não simplesmente estar triste, mas apaixonar-se pela tristeza. Desejar a tristeza, cultivar a proximidade da tristeza, sentir saudade da tristeza (quanto a este último, compare com “I miss the comfort of being sad”, em “Frances Farmer Will Have Her Revenge in Seattle“, do Nirvana) — eis uma forte afirmação do entristecer-se.

Este verso segue a “intoxicated with the madness”, o que o carrega de loucura e intoxicação, características que, segundo certa tradição, não estão distantes da paixão, do que ela tem de doentio e desencaminhador.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *