Véio é Teimoso!
Publicado emComo eu saio pouco ou nada agora eu não pego mais umas crônicas de mão beijada do pessoal na rua. Mas hoje fui ao banco e, enquanto esperava na fila e a chuva caía na Avenida Guilherme Cotching, lá veio ela, sim, a crônica, na pessoa de uma senhora negra e obesa que, andando com dificuldade, vinha saindo da agência, a princípio comentando algo sobre os velhos. Ela parou então diante das escadas e falou alto, certamente inspirada pela chuva: “E a minha laje tá tudo vazando!”. Estávamos eu no fim, um casal de bolivianos no meio e uma mulher no começo da fila, ninguém disse nada. A senhora prosseguiu: “Minha laje tá tudo vazando, o pedreiro queria me cobrar dois mil reais! Eu falei: não, vai ficar vazando mesmo. Dois mil reais e ainda trinta e duas lajes mais pedra, areia e cimento. Dois mil reais queria cobrar! Eu não sou rica não. Eu sou favelada. Eu moro na favela”. A mulher da frente disse, pra ser simpática: “É só por um balde, né?”. Nisso, a senhora abaixou o tom, falou meio triste, com os olhos adiante, contemplativos: “Menina, mas não dá… chove bem em cima da minha cama…”. Acontecido tudo isso ela decidiu ir embora. Procurou com a vista e anunciou: “Ó lá o véio!”. Presumo que é seu marido: um senhor negro com a máscara no queixo e bengala. “Ele não quis entrar”, comentou ela, “olha, sou véia, mas não gosto de véio, porque véio é teimoso!”